quinta-feira, 22 de março de 2012

Pluviana

Ela sente isto...

Seu aroma percorre todos os caminhos, mesmo aqueles mais soturnos e distantes. Segurando forte o desejo ao meu peito, para que ele não corra por ai a me denunciar, vou eu como um caprino para o Gólgota.
Ela sente isto. A sua fragrância tem o hálito das manhãs sonhadas, dos amores inconclusos. Dedos etéreos e sorriso sísmico, como não posso ficar abalado e/ou perder as estruturas?

Eu sinto isto... Seu aroma de chuva refrescante e a derme à quarenta graus, ela é feita exclusivamente para queimar e congelar.
Ela é como uma leve brisa no deserto ou um sopro quente no Alaska. Ela é a própria Chuva, ou não passsa de uma Amazona a cavalgar os ventos do Sul?
Nada posso afirmar convicto. Sei apenas que por onde passa, Pluviana, deixa uma pilha de corpos a chorar por si. Ela é uma força da natureza sob seu próprio controle, mesmo sem saber deste facto.




continua...

quinta-feira, 15 de março de 2012

O GELO

Eu andava pela rua quando me deparei com ele: estava deitado, a cabeça virada, os olhos estourados para fora. Um filete de sangue saía de sua cabeça. Aos poucos, as pessoas foram se juntando ao meu redor para ver o que eu olhava. Muitas passaram mal, outros tinham ânsia de vômito. Não sei o que fizeram com esse pobre homem que tinha a expressão de terror nos olhos. Só sei que de repente me veio uma imagem.

Eram duas pessoas. Eles estavam vestidos de calça, colete e chapéu coco. Usavam uma bengala, que tinha uma adaga escondida. A primeira era uma garota, usava um cílio postiço debaixo do olho. O segundo era um garoto negro com olhos brancos. Não faço a menor idéia de como eles vieram parar na minha frente.

Não aguentando mais olhar para aquele corpo, saí e segui para casa. A noite estava silenciosa e fria, eu andava olhando para trás o tempo todo, e tinha a nítida sensação de que estava sendo seguido. De repente uma voz de garota começou a zumbir na minha cabeça dizendo: “Nós vamos até aí. Você é o nosso brinquedo. Vamos assustar e atormentar, minha adaga vai passar por sua espinha, minhas agulhas serão cravadas no seu corpo. Nós beberemos o seu sangue.”
Era uma alucinação, isso não podia ser uma coisa lúcida. Não tinha fundamento, tentava esquecer, mas a voz voltava: “Vamos beber o seu sangue”. Não parava, e continuei a andar, até que parei diante de uma garota de chapéu coco, camisa rosa e colete preto. Ela disse “Oi" e eu senti a adaga entrando no fígado, virei para trás e o garoto de olhos brancos fez uma cruz no meu peito. A garota pegou minha cabeça e girou como se fosse um boneco. Depois desse instante eu sabia que não estava mais entre os vivos.

Vi o meu corpo, mas também vi os dois atravessarem as paredes da rua. Pensei: eles também estão como eu. Segui os dois, e eles atravessaram a parede de um prédio envidraçado, cheio de frescuras tecnológicas. Entrei, e eles não sabiam que eu estava ali. Entrei num corredor cheio de salas, eles atravessaram uma delas; seus corpos atravessaram um esquife metálico como uma jaula, e vi os dois dormindo. Olhei ao redor e tinham outros. Tinha um mural lá e uma matéria de jornal: “Assassinos são usados em experiência de criogenia.”
Então minha cabeça tentou acreditar no absurdo que se passou nela. Mas não podia fazer nada, eles atacariam mais uma vez antes que a morte definitiva os pegasse. E durante os seus poucos dias na Terra eles atacariam e não tinham forma, não tinham sangue. O que tinham era nitrogênio líquido nas veias.





quinta-feira, 8 de março de 2012

*haiku*


Cada dia nasce com o Sol
Dorme com a lua
A chuva cai
Sopra o vento

Cada folha, uma vida
Cada folha, um mundo
Cada flor, um universo
Cada flor, uma história

Levantar e seguir
Cair e levantar
Estender a mão
Contrair os lábios

Sonhar e desejar
Libertar e realizar
Viver e sorrir
Chorar e consolar

*frankj costa*